sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Fantasma

Um cigarro queimando no parapeito, um gato que mia no andar de baixo, o fantasma de Salieri, eternamente flagela-se cuspindo a Deus seu crime. Uma criança que chora, o homem que bate na mulher e diz que a ama, as vizinhas lésbicas com seus véus de aranhas.

O vizinho que sente que hoje será o seu dia, engana-se e vai ao bar beber. O pássaro que cuida do ovo do cuco como se fosse dele. A Aurora despertando, indicando mais um dia agonia. As blasfemas e balburdias do bêbado sem a droga. Todos culpados. A mulher que beija o filho dando tanta atenção ao seu fruto, sabe ela que não vai viver mais um dia para vê-lo. As ameaças, as guerras, os conflitos fazem parte de mim. O cigarro entre meus dedos é a minha pena. O medo das minhas palavras os faz culpados. Uma sombra entre Uno e o mundo, faz as coisas como são. A porra da camada de ozônio, os vermes que se alimentam de petróleo, os homens que pregam a Deus, os que morrem por ele, todos culpados. Um junkie sentado na frente do computador, ansioso pela próxima dose. O sonho do gato que conseguiu pegar o rato, agora eles são amigos. O recreio da escola, cheio de almas não lapidadas. A namorada inocente, que não sente a intenção do garoto. Homens tentando serem aquilo que não está a eles destinado, todos culpados. Uma bola que com muita pericia consegue encontrar o gol. O seu filho com quatro anos, lhe perguntando por quê. O gerente que abusa de seus funcionários porque pode, enfia o trabalho no seu cú. A janela aberta que filtra o que vem de fora. A névoa que cobre tudo e a todos, tornando densa a realidade, que todos fazem questão de ignorar. Eu não a ignoro e a vejo. Os loucos no bezerra, viciados, junkies que a ignoram, e pagam com sua sanidade. Os amigos indo para a escola, prontos para ter a tarde livre, também a ignoram. Enquanto o dia está nascendo, eu estou dormindo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário